Alcoólicos Anônimos

crédito: Bruna Serur

      O álcool é a droga preferida dos brasileiros e a que mais mata. De acordo com a Organização Mundial de Saúde, o consumo de bebidas alcoólicas, é a terceira causa das mortes ocorridas no mundo. O uso excessivo da droga causa 350 doenças físicas e psíquicas, como cirrose, câncer, inflamação no fígado, alucinações.  
            O alcoolismo não tem cura, mas existem algumas formas para se tratar. Além do acompanhamento com um profissional (psicólogo, psiquiatra), o viciado precisa do apoio da família e de grupos de ajuda. Um dos mais conhecidos e que atua em 150 países, com grupos em várias partes do Brasil, são os Alcoólicos Anônimos (A.A.). Nas reuniões, homens e mulheres compartilham suas experiências, forças e esperanças, no intuito de resolver o seu problema e ajudar os que precisam se recuperar da doença.
crédito: Bruna Serur
            O A.A. tem caráter voluntário e sobrevive com a contribuição espontânea dos próprios membros. Estes dividem suas experiências com qualquer um que procure ajuda relacionada à problemas de alcoolismo. Eles dão depoimento cara a cara em reuniões ou apadrinhando o alcoólico recém chegado. Os alcoólatras precisam querer freqüentar as reuniões e abandonar o vício. O único requisito para se tornar membro do grupo é a vontade de parar de beber. Não há taxas nem mensalidades. O A.A. também não tem ligação com nenhuma igreja ou seita religiosa, partido político, instituição.
Existem alguns tipos de reuniões. As abertas, como diz o nome, são para alcoólatras, familiares ou qualquer pessoa que tenha interesse. Um ou dois voluntários contam suas histórias com o álcool, são dados avisos e recolhidas as contribuições. As fechadas são apenas para aqueles que têm a doença. Nesta são discutidos os elementos do programa, os membros compartilham uns com os outros os problemas e esforços, são recolhidas as contribuições e dados os avisos. Há também um programa de computador, como um chat (sala de conversa). Os membros entram nesse chat e podem conversar com pessoas de todo o país, rever amigos e conhecidos da instituição, e dividir suas histórias.
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            O A.A. não recruta nem alicia membros, não faz registros das histórias contadas, não acompanha nem controla os participantes, não faz diagnóstico, não oferece moradia, hospitalização, dinheiro, nem outros serviços. O único papel da instituição é dividir entre eles as experiências vividas.


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O efeito do álcool

          Dentro de nosso organismo, o álcool possui um efeito sedativo que age diretamente no sistema nervoso autônomo, (que controla funções como a respiração, circulação do sangue, controle de temperatura, digestão e o equilíbrio das funções de todo o corpo), provocando relaxamento nos músculos. 
A ação depressiva do álcool no cérebro e no sistema nervoso central reduz a capacidade mental e física diminuindo a habilidade para a realização de tarefas mais complexas como, por exemplo, conduzir um veículo. Por isso às pessoas embriagadas falam de forma tão lenta e confusa ou, até mesmo, caem no sono quando bebem além da conta.
crédito: Bruna Serur
Segundo a Psicóloga Fátima Pereira a ingestão do álcool não é algo tão simples. “Uma parcela do álcool introduzida no organismo é absorvida pela mucosa da boca. A grande maioria, porém, é absorvida pelo estômago e intestino delgado, e daí vai para a circulação sanguínea. Aproximadamente 90% do álcool é absorvido em 1 (uma) hora. O processo de absorção do álcool é relativamente rápido (90% em uma hora). Porém o mesmo não ocorre com a eliminação, que demora de 6 (seis) a 8 (oito) horas e é feita através do fígado (90%), da respiração (8%) e da transpiração (2%)”, afirma.
É comum ouvir dizer que é a ingestão do álcool em doses determinadas não altera os efeitos psicológicos. Essa afirmação é falsa, pois às vezes o indivíduo ingere uma pequena dose que o efeito é idêntico a ingestão de uma grande dosagem alcoólica. Logo, em quantidades determinadas, o indivíduo é afetado de formas diferentes em diversas oportunidades.

Em pequenas doses, a influência da bebida alcoólica geralmente pode ser um pouco estimulante pelo fato de relaxar a tensão diária e de fazer com que as pessoas se sintam mais abertas com os outros. Independente de algumas pessoas se tornarem mais irritadas ou alegres, em geral, quando bebem ninguém pode prever com precisão seus comportamentos. O que a grande maioria das pessoas que bebem não sabem, é que o maior problema com o álcool são os efeitos psicológicos causados.
A bebida alcoólica pode interferir drasticamente no funcionamento da memória, fato que ocorre frequentemente com pessoas que bebem exageradamente por um longo período de tempo. Esta interferência faz com que as pessoas dominadas por este vício percam completamente sua capacidade de armazenar suas memórias recentes. Esta condição é conhecida como síndrome de Korsakoff, e pode ser muito perturbadora. 
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Além disso, o álcool também prejudica a capacidade de julgamento, ou seja, independente da pessoa ter bebido muito ou pouco, ela apresentará falhas em sua coordenação motora que geralmente não apresentaria se estivesse sóbria; contudo, ela terá a sensação de que nada lhe sai do controle. 
        O álcool pode causar dependência, e essa necessidade é conhecida como alcoolismo que se caracteriza por uma obsessão gradativa pela bebida que se instala lentamente no indivíduo até, nos últimos estágios, dominá-lo inteiramente.



Depoimento de Jovens sobre o álcool:

Jovenseoalcool by inebriandose

Fonte: Psicóloga Fátima Pereira

Depoimento: José de Abreu


            Aos 58 anos, José de Abreu tem uma história de superação e luta. De seis irmãos, onde ele é o mais velho, quatro homens e duas mulheres, todos bebiam. Alguns pararam, outros não. Seu pai era muito pobre, mas conseguiu crescer na vida, se tornando um dono de uma construtora, e assim pôde dar uma vida de classe média alta para José e seus irmãos. Por isso estudaram a vida inteira em colégios bons.
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            José começou a beber por influência dos amigos. Ele andava com uma turma do bairro conhecida como “Turma da Pesada”, “Os filhinhos de papai”, “Os intocáveis”, pois eram todos de família tradicional. Sempre fez muita coisa errada na adolescência envolvendo a bebida, mas nunca foi parar em uma delegacia porque as pessoas conheciam o seu pai e sabiam que ele era influente.
            José casou, e até ter o segundo filho vivia em boas condições, trabalhando. Quando o seu terceiro filho nasceu, ele tinha três carros, mas o vendeu para gastar com bebidas e mulheres. Nessa época a doença já havia tomado conta da sua vida, não tinha mais controle sobre si mesmo. Por causa da bebida, pelo péssimo convívio com os companheiros e por achar que estava sempre correto ele foi afastado do emprego de inspetor da Polícia Federal. Com isso, passou a tomar conta de um matadouro, saindo para beber todos os dias com pessoas que não tinham boa índole. Com eles, José passava três dias fora de casa.
            Quando chegava em casa nos fins de semana, alcoolizado, quebrava móveis e decorações. Ele tinha uma arma, e sempre que a mulher reclamava do estado em que ele estava José apontava uma arma para ela e para os filhos que tentavam defender a mãe. Com medo, os filhos e a mulher iam se esconder nas casas dos vizinhos. Lá eles dormiam até o efeito da bebida passar e então voltarem para casa.
            O filho mais novo de José, quando tinha 10 anos, saiu de casa antes de o pai chegar para evitar o confronto. Ele foi parar em um bar que tocava pagode, e lá, na música, encontrou um refúgio. Todas as noites ele passava no bar para tocar um pouco e não sofrer vendo o pai chegar alcoolizado. Isso aconteceu até o seu filho completar 16 anos. Nessa época José já não trabalhava mais, seu último emprego foi na área de frios de um supermercado. Ele foi demitido por causa do alcoolismo.
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            A partir disso, ele resolveu parar de beber. Freqüentou algumas reuniões dos Alcoólicos Anônimos (AA), mas não continuou indo às reuniões. Usando toda a sua força de vontade, resolveu que ia parar de beber, pois percebeu que tudo aquilo que os pais lhe deram e toda a vida que ele tinha, havia sido destruída por causa da doença. Entrou para o espiritismo e faz parte atualmente de uma doutrina chamada “Vale do Amanhecer”. É um cara religioso e apesar de tanto sofrimento os filhos lhe consideram um ótimo pai.

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Depoimento do voluntário do AA sobre a relação família e álcool:

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Formas de Tratamento

Por ser uma doença crônica (que não tem cura) há diversas opções para que o dependente se recupere do seu vício. Estes métodos podem ser adotados mutuamente. O usuário, de acordo com sua autonomia na doença, pode até escolher o tratamento que achar, pessoalmente, mais eficaz ou o que ele mais se identificar.
O tratamento mais conhecido se dá por ingestão de remédios, mas este processo não pode ser desvinculado de um acompanhamento psiquiátrico e psicológico. O método funciona com consultas com uma equipe multidisciplinar acompanhado do apoio da família para que haja a clareza e discussão do tratamento para que haja o estímulo para combater o vício.
crédito: Bruna Serur
A maioria dos tratamentos seguem o principio de que é necessária a abstinência total do álcool mas existem tratamentos que estimulam uma redução gradativa do consumo. 
Existem também os grupos de auto-ajuda (o mais conhecido é o AA - Alcoólicos Anônimos) que funcionam com o programa de 12 passos, além de reuniões periódicas com pessoas que compartilham os problemas que envolvem a recuperação. Esses grupos acabam, por conseqüência, deixando o alcoolista mais à vontade para falar o que sente sobre a situação na qual se encontra, aceitando a doença que possui.
crédito: Bruna Serur
O conceito de recuperação do alcoolismo funciona com a desintoxicação, que por conseqüência trata os efeitos físicos do álcool, mas que não garantem que o usuário não tenha recaídas e com o recurso que previne a recaída: o tratamento psicológico com terapias em grupo, psicoterapias... Ambos são essenciais para a recuperação do vício.
O mais importante de todos os tratamentos é que o usuário pode sentir que está se recuperando, mas também tem a consciência plena de que as recaídas existem e podem acontecer. Portanto é de extrema necessidade que todos os tratamentos que fez possam ser recorridos posteriormente. Nos casos dos grupos de auto-ajuda, por exemplo, esta pessoa que está voltando ao ambiente deve se sentir familiarizada com a situação, o que pode ajudar em uma recuperação mais rápida e fazer com que esta pessoa se sinta mais à vontade, assim deve ser nos CAPS, terapias em grupo e todas as outras formas.




Pontos positivos e negativos do consumo alcoólico

De acordo com o estudo publicado pelo Archives of Internal Medicine, adultos e idosos que consomem de uma a sete doses de bebidas alcoólicas por semana podem viver mais e com menor risco de complicações cardiovasculares que os que não bebem – e que os que bebem demais.
CRÉDITO: Bruna Serur
O consumo leve ou moderado de álcool reduz os níveis de proteína C-reativa e de interleucina-6, compostos que circulam no sangue quando ocorre inflamação.  Não importa que tipo de álcool o indivíduo escolhe, se cerveja, vinho ou algum destilado. Porém, a forma como a bebida é ingerida parece ser importante. Cerveja e vinho costumam acompanhar as refeições, e os alimentos diminuem a absorção do álcool, o que é bom. Pessoas que bebem sem os alimentos costumam exagerar nas doses.
            A moderação é essencial para a saúde, ou seja, uma dose ao dia para mulheres e duas doses para homens é o limite. Isto acontece porque o álcool afeta homens e mulheres de formas diferentes. As mulheres tendem a se intoxicar com doses menores de álcool já que possuem menos água corporal e as enzimas que quebram o álcool menos ativas. (O mesmo acontece com os idosos.) Outro problema é que o álcool aumenta a incidência de osteoporose no sexo feminino e se tornam dependentes com mais facilidade que os homens.
Os responsáveis pelo estudo investigaram a relação entre álcool, morte e doenças coronárias como internamento por enfarte do miocárdio, dor pré-cordial em 2.487 adultos sem qualquer antecedente coronário, com idade entre 70 e 79 anos.
Dos participantes, 55% eram mulheres e os outros 45% homens e todos responderam a um questionário sobre doenças, uso de medicamentos e hábitos alcoólicos. Os voluntários foram classificados pelo número de bebidas consumidas, semanalmente, ao longo do ano anterior ao início do trabalho.  As categorias foram: nunca ou ocasional (menos de uma dose por semana); leve ou moderado (uma a sete); e frequente (mais de sete). Durante o estudo, cada indivíduo fez exame ao sangue. Quase metade dos participantes estava na categoria nunca ou ocasional.
         Comparados com consumidores ocasionais, os que bebiam de forma leve ou moderada tiveram 26% menos prevalência de morte e quase 30% menos de prevalência de doença coronária, mesmo depois de eliminado o efeito anti-inflamatório do álcool. Em contraste, nos consumidores frequentes ocorreram mais mortes e doenças coronárias que todos os outros. Mas os efeitos benéficos do álcool podem não funcionar para todos, alertam os autores do estudo. O benefício líquido do consumo moderado pode variar em função do sexo, etnia ou risco cardiovascular já existente.


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Outras informações: Riscos e Benefícios do álcool
                                    Estudos sobre os benefícios do álcool 

Entrevista com Psicóloga



Conversamos um pouco com a psicóloga Patrícia Freitas que trabalha em um CAPS de Recife e lida cotidianamente com o combate ao álcool. Além de atender à família e ao alcoolista pessoalmente, ainda trabalha com dinâmica em grupo formado pelos usuários e pratica a Arte-terapia como uma maneira alternativa de desvincular os dependentes do álcool.

Inebrinado-se!: Como identificar se o usuário do álcool tem realmente o vício?

crédito: Bruna Serur
Patrícia Freitas: O vício é identificado a partir do momento em que a pessoa se vê dependente: passa a substituir práticas que eram antes importantes em seu cotidiano para consumir a droga, coloca a bebida em primeiro lugar, seu comportamento vai mudando aos poucos sem que ela sinta. Por isso é normal que primeiro a família desconfie da doença... O passo essencial é de que o alcoolista se assuma e se perceba como alguém que realmente esta doente e precisa de ajuda. Desta maneira, buscar o controle com profissionais fica mais próximo de sua realidade.

I: Quando o dependente decidir procurar ajuda, a quem ele deve recorrer?

P: O primeiro passo é ir à procura de profissionais aptos para lidar com a situação. Existem unidades de desintoxicação em caso de pacientes que estão muito intoxicados e há o CAPS (Centro de Atenção Psicossocial) no qual o paciente pode ter melhor acompanhamento e recuperação. Nele há o atendimento médico de um Psiquiatra, há Psicólogos, Assistentes Sociais... São feitos vários acompanhamentos e atividades pelos profissionais.

I: Existe uma média de tempo para que o paciente deixe de necessitar ajuda médica?

P: Não. Isso é muito relativo. Existem pessoas que começam o tratamento mas têm uma recaída, outras que recebem alta mas depois de alguns anos voltam a necessitar do atendimento novamente... Psicologicamente falando esta pessoa sempre poderá se envolver novamente e se tornar dependente. Existem os comportamentos de riscos que podem levar a uma recaída... Mas o alcoolista sabe que tem que ter muita força de vontade para não cair novamente...
crédito: Bruna Serur

I: Quanto à abstinência muita gente acha que, quando se trata do álcool (uma droga legalizada), o momento da abstinência é mais ameno. Isto é verdade?

P: Este é um dos maiores mitos. A abstinência do álcool pode causar ansiedade, irritabilidade, tremores, suores, náuseas, aumento da pulsação cardíaca, taquicardia, insônia, febre... Muitas sensações são comuns às do dependente de qualquer outra droga.  O conceito de que o consumo de álcool faz menos dado à saúde é completamente errado e muito perigoso pois muitas vezes as pessoas acham que não vão se viciar exatamente porque o álcool é mais comum, todo mundo consome... Ele pode causar doenças graves como AVC e cirrose hepática.

I: Qual a importância dos familiares na recuperação?

P: A presença e apoio da família são essenciais. O usuário tem que se prender àquelas pessoas com as quais há intimidade para poder se sentir apoiado e para saber que há razões para a reabilitação. Se a família e amigos não apóiam, a pessoa se sente só e sem motivos para continuar o tratamento. Acaba tendo recaídas, não levando a sério a presença no tratamento... Acaba vendo que não tem ninguém ao seu redor que o estimule a continuar.



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